terça-feira, 18 de novembro de 2014

A carta do Pai Natal - 47


Sofia é uma pequenina muito "safada" e muito esperta.

 

Aproximando-se a época natalícia, os pais disseram-lhe que estava na altura de escrever uma carta ao Pai Natal para pedir os presentes que gostaria de ter, mediante o seu bom ou mau comportamento.

 

Ao contrário do que se esperava, a Sofia não se mostrou muito interessada. Os pais diziam-lhe "vamos escrever", mas ela não estava mesmo interessada. Perguntaram-lhe porque é que ela não queria escrever a carta e ela respondeu simplesmente: "amanhã". Os pais insistiam e ela continuava aparentemente indiferente, respondendo sempre o mesmo "amanhã". 


Intrigados, os pais perguntaram: "porque não hoje"? Então ela, na sua pureza de criança, respondeu com toda a verdade possível:

 

- "Amanhã, poque hoje, ainda vou potar um bocadinho mal" (!)

 

quinta-feira, 25 de setembro de 2014

Palavras - 46


A Sofia ia sentada na sua cadeirinha no banco de trás do carro, como de costume. E eu ouvia-a a falar, falar, sem perceber nada do que ela dizia, enquanto ía entretida a ver a vista pela janela do carro.

 

A páginas tantas perguntei-lhe o que é que ela estava a falar, que não estava a perceber. A Sofia, pequenina, respondeu:

 

- "Tô a falá palavas"... (?)

 

Os papeles - 45


Eu tinha feito uma colecção com as embalagens dos pacotinhos do café, que tinham uns desenhos muito amorosos, com situações muito diversificadas, mas cujo tema é sempre o "amor", relacionado com o café. E como eram bastantes, arranjei até uma bolsinha, mesmo à medida, para os guardar e dar à Sofia, porque achei que ela ia achar graça aos desenhos.

 

Assim que o carro começou a andar, tirei a bolsa do meu saco de mão e dei-lhe. Ela espreitou, tirou as embalagens todas que caíam e eu apanhava e ficou toda contente com aquilo. Quando chegámos, dado que íamos levá-la a brincar ao parque, a mãe convenceu-a a entregar-lhe a bolsinha, que guardou no saco dela, dizendo-lhe que depois lha daria novamente. Ela aceitou.

 

No regresso, entrando no carro e instalada na sua cadeirinha, logo se lembrou das embalagens do café, gritando: os "papeles"! E enquanto a mãe lhe dizia para esperar um pouco ela continuava a gritar "os papeles!"... "os papeles!"...


sábado, 2 de agosto de 2014

Perguntas difíceis - 44


A Tânia estava a deitar a Sofia que já estava com soninho. Foram à casa de banho para fazer o último xixi antes de pôr a fralda que só já usa para a noite.

 

E no calor da noite das férias do Algarve, com a Sofia excitadíssima por estar todos os dias na companhia dos primos e com todos os tios e toda a família por perto, em que cada dia traz coisas novas e surpresas e muita praia e piscina, muita canseira boa... a Sofia na sua ingenuidade de criança ainda tão perto de ser bebé, com a curiosidade pueril e a vozinha diabolicamente angélica, pergunta:

 

- Mãe, como é que se ama? (?!)...

 

segunda-feira, 21 de julho de 2014

Os "pimos" - 43


As crianças são uma delícia!...

 

A Sofia fez três anos há poucos dias. Estávamos de férias no Algarve e todos os dias ela estava com os primos na praia.

 

Muita brincadeira, muita excitação, muito gelado, muito tudo... ela adora os primos.

 

Um dia, para que eu ficasse a saber, ela virou-se para mim e com um ar compenetradíssimo, disse-me "os pimos são meus pimos".

 

Ok.



segunda-feira, 21 de abril de 2014

Outa? - 42


A Sofia foi com a sua mamã para Amesterdão, ter com o pai, para passarem juntos umas mini-férias de Páscoa.

 

Acontece que ela já anda a aprender inglês, porque em setembro vai para os Estados Unidos, onde ficará dois anos e para não ser um choque muito grande com a língua, já se está a providenciar o ensino do inglês, ainda que de forma ligeira. Mas por isso, ela já sabe que não se fala só o Português, ou seja, há outras maneiras de falar. Pelo menos outra maneira de falar e essa outra maneira de falar é o inglês, que ela diz "igalês".

 

Então a mãe explicou-lhe que iam de avião para uma terra diferente, Amesterdão e que lá não se falava Português. Falava-se Inglês e Holandês.

 

A Sofia, docemente perplexa, olhou para a mãe e perguntou: "outa"?!...

 

quarta-feira, 9 de abril de 2014

Terrorista - 41


A Sara é uma menina da comunidade Guineense, que faz parte do grupo de crianças a quem dou apoio escolar no Prior Velho, juntamente com outros voluntários.

 

Ela é uma menina simpática, meiga, bem esperta e muito bonita, com as trancinhas sempre muito bem feitas e sempre muito bem vestida.

 

Esta semana fui dar-lhe apoio nos trabalhos. Sentei-me junto dela e perguntei quais eram as dúvidas, ao que ela logo me respondeu que não sabia fazer "aquilo". Aquilo era formar quatro frases com palavras a partir da palavra "terra". Então vamos lá, disse-lhe eu. É muito fácil. Primeira palavra formada a partir de "terra". Ela olhou para mim e com um tom cheio de convicção, respondeu: 


- Terrorista (?)



sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Quando eu for grande... - 40


A Sofia adora estar com os primos para todo o tipo de situações. No fim de semana passado, mais uma vez, passou com eles algumas horas e depois os pais tiveram que levar o Daniel, que fez recentemente um ano, para casa da avó, o qual foi transportado no respectivo ovo.

 

No carro, ao lado do primo, começou logo por fazer cena porque não queria a mãe ao pé. Queria ser ela a tomar conta dele a cem por cento. Depois, quando chegaram a casa da avó, o pai pegou no ovo com o Daniel lá dentro e a Sofia continuou a guerra dela porque queria ser ela a levar. Depois de ter percebido que não podia ser, consentiu que o pai pegasse e ela desse uma ajuda, o que muito dificultou as coisas.

 

Finalmente, quando chegou a casa da avó e percebeu que o primo ia lá ficar, a guerra explodiu de vez. Ela queria levar o Daniel para casa dela e ser ela a tomar conta dele. Gritou, esperneou, chorou, chorou muito, muito, muito e quando, enfim, percebeu que era inútil porque, com dois anos, não poderia de maneira nenhuma tomar conta do primo, entre soluços, disse à mãe:

 

- Quando eu for grande quero ser mamã de bebés.


terça-feira, 21 de janeiro de 2014

As cuecas da Sara - 39


Pequenininha, a Sara, teria uns dois anos, quando um dia fui com ela a uma loja ao lado do prédio onde moravam, porque ela queria qualquer coisa e a mãe estava ocupada, pelo que me pediu para a levar.

 

Enquanto eu tratava do assunto vi chegar ao pé dela um garotinho, sensivelmente da mesma idade. Ficou frente a frente com ela, encheu o peito de ar e apontava para o desenho da sua T-shirt, que ele não se cansava de exibir, tentando fazer inveja à Sara. Punha as mãozinhas com os dedos apontados aos vários pontos mais interessantes da t-shirt, ao mesmo tempo que bamboleava o corpo, numa ligeira dança para a direita e para a esquerda.

 

A Sara pequenita, com uma boneca debaixo do braço, olhava para o garoto aparentemente indiferente. Não liguei e continuei à procura do que tinha ido comprar. Até que, de repente, ouço a avó do garoto ralhar com ele, dizendo-lhe para estar quieto. Olhando, vejo então o garoto que continuava exibindo, cheio de vaidade, a sua t-shirt e a Sara, que tinha acabado de vestir umas cuequinhas novas com uns bonecos muito fofos, com o vestido levantado até às orelhas, barriga empinada para fora, rodando o corpo de um lado para o outro e apontando para os bonecos sobre o seu pipi. 

 

Pronto, não resistiu, e afinal não estava em desvantagem. Também tinha algo novo e bem giro, por sinal. Mas acima de tudo, muito adequado para mostrar.



segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

Jacaré/crocodilo - 38


Quekuto é uma das crianças da comunidade Guineense, a quem a organização "Coração Sem Fronteiras" dá apoio escolar, na freguesia do Prior Velho.

 

Quekuto é um turbilhão de emoções, todas ao mesmo tempo. No ano passado eu não consegui trabalhar com ele, nem um pouco. Não nos entendemos de jeito nenhum. Ele entrava e saía, saía e entrava e voltava a entrar para imediatamente sair. Ignorava tudo e todos, sempre a refilar, só fazendo o que ele muito bem queria, com aquele ar reguila que todos lhe conhecem. E no ano passado, a solicitação das crianças era tão grande e as nossas dificuldades tantas que eu deixei-o ir na onda dele, sem fazer grandes esforços, porque também não era possível fazer mais, e milagres muito menos. Pensava eu.

 

Este ano, o Quekuto continua a ser o mesmo reguila, irrequieto, um desassossego completo, mas... há nele, nas mesmas proporções, um lado doce, carinhoso, sedento por ser mais e melhor, que no ano passado não me foi revelado. Este ano, Quekuto e eu fizemos as pazes e o milagre deu-se! E tem dias que a cada cinco minutos me pergunta exaustivamente "tou a portar bem?" E eu respondo "sim" e volta à carga "tou a portar bem?" Sim e ele continua, interrompendo a lição, as explicações, tudo, interrompendo a minha direcção, a minha linha de planeamento dos trabalhos, tudo, para esgotar a minha paciência com aquela lenga-lenga a que junta intencionalmente um toque de humildade, com o propósito de que eu não me arrependa de dizer "sim" porque, mais tarde, ambos sabemos que será cobrado. Uma vez Quekuto, sempre Quekuto.

 

Todavia, Quekuto já consegue estar onde os outros estão e ser como os outros são, nunca deixando de ser ele mesmo, pelo que com ele a atenção é redobrada, triplicada, enfim... é preciso chegar lá, porque eu sei que ele quer, quer muito ser bom na escola como é na bola. E ele pode, porque outros poderão não ser, mas ele é esperto, inteligente e apanha tudo com imensa facilidade. Já me chateei muito com ele este ano, já foi recado para casa e castigos no apoio. Mas, decididamente, este ano a coisa vai.

 

Há dias, estávamos na leitura e a páginas tantas aparece a palavra "jacaré", que ele leu sem grande dificuldade. Mas como eu sei que muito do vocabulário que eles lêem, desconhecem o significado e para não deixar as crianças na ignorância, prefiro perguntar se sabem o que é. Foi o que fiz. Perguntei-lhe se sabia o que era um jacaré. Ele olhou para mim, abanando a cabeça várias vezes em sinal afirmativo, com aqueles seus olhos grandes, que dizem e exprimem o tumulto que lhe vai na alma de criança. E para ter a certeza de que ele realmente sabia e não só - é necessário que saibam exprimir-se de modo mais fluente -, pedi-lhe que dissesse o que era um jacaré. Ele voltou a olhar para mim com um olhar mais tranquilo, o que significava que sabia o que era. Mas eu estava curiosa, porque para mim um jacaré e um crocodilo são a mesma coisa. Não são, mas confesso a minha ignorância. Por isso queria ver como é que ele se saía com aquela resposta. 


E sem se atrapalhar, olhando nos meus olhos, primeiro vieram todos os tiques nervosos, abrir e fechar de olhos automático, depois começou a surgir o som aos solavancos, a mastigação nervosa e finalmente, por entre a gaguês:

 

- U u  um jacaré é ummm crocodilo.