Eu
estava sem carro que, por qualquer razão, estava na oficina. O Luis e a
Eunice moravam para os nossos lados e deram-nos boleia. A
Eunice estava grávida de sete meses do segundo filho. O
Henrique ia sentado no banco de trás ao pé de mim e começámos a falar
da gravidez dela.
Ela
era Cabo Verdiana por parte da mãe, portanto, não tinha a pele
completamente branca. O tom de pele era de Cabo Verdiana. O Henrique,
olhava para ela e para a barriga, com grande insistência. Ele deveria ter uns
seis anos nessa altura e claro, já tinha visto mulheres grávidas, mas nunca
tinha dado tanta atenção e talvez nunca tivesse estado tão perto. Quis
tocar na barriga dela e o ar dele era de admiração. O facto é que havia
qualquer coisa que o intrigava. Via-se na fisionomia dele. Mas não me passava
pela cabeça o que poderia ser.
No
dia seguinte, estávamo-nos a vestir e a preparar para começar um novo dia,
quando ele me fez a seguinte pergunta: "quando a mãe estava grávida
de mim, a mãe mudou de cor?"
Parei
para pensar na pergunta, que aparentemente não fazia sentido. Além
disso, estava habituada à sensatez e à coerência dele em tudo. Era uma criança
precoce e tinha um entendimento muito avançado. Segundo a médica, havia um
desfasamento de dois anos para mais o que, com o passar dos anos, deixaria
de ser significativo e eu entendia isso perfeitamente. Todas as perguntas
que ele nos fazia tinham razão de ser, tinham lógica, eram ponderadas. Mas
aquilo saiu assim de um jeito que me deixou desconsertada e até meio irritada,
por isso, respondi-lhe um pouco secamente, que não entendia a pergunta.
Disse-lhe que ele não costumava fazer perguntas tontas, que as pessoas não
mudam de cor, são sempre como são e quis que ele explicasse porque fazia
semelhante pergunta. Ele, coitado, não se desmanchou. Provavelmente ele próprio
achava estranho, mas naquela cabecinha havia uma questão pertinente e
continuou: "é que, no anúncio, diz que muda a cor!"
Ouvi
o que ele disse e fiquei novamente desconsertada. A coisa não se estava a
compor, achava eu. No anúncio diz que muda a côr? Perguntei então: qual
anúncio? Respondeu, com ar sério e humilde "da televisão...". Da televisão? Pensei
- publicidade. Como eu continuava parada a olhar para ele, enquanto
procurava equacionar os dados, ele continuou: "sim,
no anúncio diz - se estiveres grávida muda a côr"....
Mentalmente
revi o anúncio do teste da gravidez, onde a menina dizia realmente:
"se estiveres grávida muda a côr" - a côr da palheta do teste. Voltei
atrás, à primeira pergunta dele, que relacionei com a seguinte e começou a
fazer-se luz.
Ele associou a mudança da côr, à côr da pele, pelo facto de ela ser Cabo Verdiana e não à côr do teste, cujo pormenor ele desconhecia. Ele só sabia que mudava a côr e a Eunice realmente tinha uma côr diferente!
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